A poesia não presta
Jogo de palavras insinuantes
Devaneio de pessoas instáveis
Sem sentido prático
Ansiosas
Com a cabeça nas nuvens
Irresponsáveis
Inúteis
A poesia serve apenas para esconder cobardias
Fraquezas
Ruínas
Desilusões
Lágrimas
Ou
desejos inconfessáveis
Alegrias patéticas
Milagres
Visões de um mundo fantástico por medida
A poesia não é coisa séria
Emaranhado de becos sem saída e ruas obscuras
- calçadas húmidas de cristal
De decisões impossíveis
- porque quem decide não é sensível
- fractura
Rasteira a egos delicados que não se rendem
À planura dos manuais de procedimentos
À banalidade da origem e do destino
Das horas marcadas e das coisas irremediáveis
A poesia é uma enchente de um rio sem margens
- porque as margens são a morte
Actual ou adiada
E com a poesia não se morre
- porque as palavras que dançam não morrem
- continuam na sua vertigem
- para sempre
- deslumbradas por conjugações improváveis
- a cantar coisas sem nexo
- naturalmente
- porque a poesia não tem nexo
A poesia é o cansaço de escrever
A querer mais
Sempre mais
A raiva de ser desviado da magia pela sobrevivência
Ou pelo bom senso
- buraco de gente parada no futuro
A poesia é uma fissura breve no cansaço de viver
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