As pessoas estão fartas do mesmo. Não sabem qual é a saída, sabem apenas que o que está não presta, de facto, ao contrário do que dizia o outro, o que está não se aguenta. Os mesmos políticos, dos mesmos partidos, das mesmas organizações, que têm cada vez menos de representativas, não levam a lado nenhum. Vira o disco e toca o mesmo. O que ontem era um ultraje amanhã torna-se indispensável para o saneamento das contas. Os que disseram ontem vergonha, fazem amanhã exactamente dessa maneira. E depois há os que sempre disseram “não” da mesma maneira e com a mesma falta de resultados concretos. Foi tudo isto que, em Itália, esteve por detrás do sucesso eleitoral de um comediante que passa a vida a gritar que é preciso mandá-los todos para casa. O problema é que a criatura não sabe o que fazer desse capital de protesto e põe-se ostensivamente de fora de qualquer alternativa para a governação do país, criando, na prática, um enorme impasse. Porque gritar é fácil, assumir responsabilidades e sobretudo propor acções concretas para melhorar a vida das pessoas é muito mais difícil e arriscado. Esse capital de protesto pode esfumar-se ainda mais rapidamente do que apareceu e depois o comediante passará a ser apenas comediante de segunda categoria em vez de brincar com os sonhos e com a realidade de milhões de pessoas. Não basta pegar num megafone e adornar problemas com adjectivos hiperbólicos. Os problemas não vão desaparecer apenas com uma vontade sonante de que desapareçam. E o verdadeiro problema é que os problemas são de uma complexidade que torna a sua resolução incompatível com os espaços nacionais e com o curto ou médio prazo.
O padrão de vida a que tantos europeus estão habituados não é sustentável. Os filhos e netos da classe média das últimas décadas não poderão ter os mesmos privilégios. O ascensor social parou. Entrou-se num plano inclinado que puxa para baixo cada vez mais pessoas e grupos. E esse processo ainda apenas começou. As frustrações presentes vão sendo atenuadas com a antecipação das heranças e com o consumo do capital. Mas isso só funciona para quem tenha capital e dura enquanto dura. As convulsões sociais para resistir heroicamente a essas tendências vão agudizar-se. O aumento da desigualdade na distribuição do rendimento que normalmente acompanha as recessões não ajuda e agrava a percepção de injustiça social que, por sua vez, aprofunda os conflitos.
Os sectores de tecnologia convencional ou intermédia que criam os milhões de empregos que são precisos estão debaixo de intensa concorrência das partes do mundo que finalmente chegaram à industrialização. Os sectores de alta tecnologia criam valor encaixado por uma minoria, criam alguns poucos empregos altamente qualificados e proporcionam oportunidades de deslocalização para sectores a jusante.
A democracia permite - e bem - a manifestação das opiniões e da resistência à perda de benefícios. Torna as mudanças mais lentas e suaves porque implica negociação e compromisso. A democracia não rima com mudança radical e favorece a cristalização de alguns interesses. A situação torna-se perigosa quando os desfavorecidos do sistema deixam de acreditar no próprio sistema, por falta da sua eficácia para resolver os problemas, colocando-se então nos braços da demagogia, do populismo e do autoritarismo. De facto, temos muito a aprender com os anos 30 do século passado.
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