Os dirigentes europeus devem estar apenas a tentar ganhar tempo, sabe deus a que preço e com que amplificação de efeitos retardados. Explico-me. O que eles pensam é: vamos ajudar agora a malta do sul durante uma conjuntura adversa porque o ciclo económico inverter-se-á daqui a pouco e tudo tornará à normalidade. O problema é que divergência persistente entre países membros de uma união monetária é fatal e temo que tal divergência, no contexto europeu, seja mais estrutural do que conjuntural. Dir-se-á: o Tenessee nos EUA também está persistentemente atrasado em relação a outros estados americanos e não é por isso que o dólar fica em crise. Pois, mas as pessoas do Tenessee podem passar para outros territórios com mais facilidade do que os portugueses ou gregos passam para a Alemanha, a Suécia ou a Finlândia. O mercado de trabalho (e de bens, serviços e capitais) é mais aberto e permeável na América porque as barreiras culturais, linguísticas, legais, etc. são muito menores do que na Europa, esta manta de Estados legitimamente orgulhosos dos seus pergaminhos. Por outro lado, o Tenessee pode beneficiar de uma transferência sustentada de fundos do orçamento federal. Existe ali uma união, simultaneamente, monetária, orçamental e política, o que claramente (ainda) não é o caso na Europa.
Portanto, não questionar já os fundamentos e a viabilidade da actual união monetária europeia implicará injectar fundos (à pressa e cada vez mais) em economias estruturalmente carentes que apenas adiam o problema. Ou: (a) a conjuntura fica milagrosamente expansiva em toda a Europa de forma permanente, contagiando positivamente os Estados-membros actualmente em crise e “arrastando-os” para cima, (b) os Estados-membros mais prósperos aceitam continuar a subsidiar o status-quo das “economias problemáticas” (como o orçamento federal ajuda o Tenessee), (c) esta bomba chamada euro (na sua actual configuração) vai explodir com grande estrondo e sacrifício daqui a algum tempo. A hipótese (a) parece-me fantasista. Serviu só para parodiar a situação. Até porque o crescimento global vem cada vez mais de fora da Europa… A hipótese (b) implicaria fuga para a frente, ou seja, avançar a todo o gás para o federalismo, aprofundando uma solidariedade cada vez mais escassa. A hipótese (c), infelizmente, parece-me a mais provável e poderia conduzir ao desmembramento da actual união monetária europeia, eventualmente substituída por duas sub-uniões com dois euros, um euro de primeira dos “países virtuosos” do norte e um euro de segunda dos “países indisciplinados” (mas criativos e bem dispostos…) do sul. Naturalmente, uma outra hipótese mais radical e destrutiva para os países do sul seria pura e simplesmente abandonar o euro e passarem a ligar-se ao resto da união por laços de pura união comercial, como existia antes da “ilusão euro”. Sejamos claros: sair do euro e reintroduzir o escudo de forma instantânea, implicaria uma brutal desvalorização da economia nacional. Tão simples como: os passivos herdados em euros continuariam em euros enquanto os activos passariam a ser denominados numa moeda que ninguém quereria no exterior…
Era importante que a malta que nos governa, não apenas aqui, mas em Berlim, Paris, Madrid, Roma, parassem um bocado para discutir “the big picture” e ter coragem para tomar as verdadeiras, grandes decisões que passam pela maneira como tem sido construída a Europa e como pode ser reconstruída ou desconstruida para bem de todos os parceiros.
Sem comentários:
Enviar um comentário