Há duas coisas especialmente preocupantes nos últimos desenvolvimentos da crise que nos devora.
Em primeiro lugar, junto dos nossos credores internacionais, instala-se a percepção de que haverá um problema especificamente português, enquanto até há algum tempo pairava a ideia de que sofriamos, essencialmente, do contágio dos problemas alheios, sobretudo gregos e irlandeses. A descolagem do prémio de risco da nossa dívida em relação ao prémio de risco da dívida espanhola é disso testemunho. Os espanhóis emitem empréstimos a taxas com uma margem de risco que passou a ser menos de metade da margem de risco portuguesa. Nós estamos a pagar cerca de 3.8% mais do que os alemães, enquanto os espanhóis pagam pouco mais de 1.5% acima dos alemães. Há algumas semanas a diferença era muito menor. Também é verdade que é mais fácil "atacar" uma economia como a portuguesa do que um gigante como a Espanha. A queda da Espanha teria efeitos demolidores e a sua cura custos insuportáveis. Falei em "ataque" porque disso se trata. Não é por acaso que as más notícias são propagadas nas vésperas das emissões anunciadas pelos Estados, fazendo subir as margens, para gáudio dos investidores e dos bancos que colocam esses títulos. Não acredito em bruxas mas que as há, há! A possibilidade da queda de um país fraco e isolado encoraja os especuladores a torná-la realidade... E eles sabem como fazer precipitar as coisas e, melhor ainda, como ganhar rios de dinheiro com isso. Não estou a dizer que seremos umas pobres vítimas inocentes da cupidez dos credores externos. Estou a dizer que as fraquezas da nossa economia e a falta de resposta eficaz aos problemas de solvabilidade externa são amplificados e acelerados por um sistema que segue uma racionalidade puramente financeira e que não é regulado ao nível adequado.
O segundo sinal preocupante decorre do facto de os bancos estarem neste momento a socorrer o Estado, emprestando-lhe cada vez mais numa conjuntura de pouca liquidez e de insuficiente poupança das empresas e das famílias. Esse dinheiro vem (excessivamente) de empréstimos a curto prazo do Banco Central Europeu que, de qualquer modo, custam menos do que outra dívida externa contraída directamente pelo Estado ou pelos bancos. No princípio da crise, depois do Verão de 2008, o Estado foi chamado a tapar os buracos dos bancos, concedendo garantias e, nalguns casos (tristemente célebres) injectando dinheiro. Agora o Estado, ironicamente, depende da ajuda dos bancos, ajuda essa que implica menos crédito a outros sectores da economia. Estamos a atingir a situação em que a cama é demasiado grande para o cobertor: para tapar de um lado, destapa-se do outro. Ou seja, é preciso encurtar a cama, o que quer dizer: mais austeridade. E já! Porque a paciência dos credores externos está perigosamente a acabar.
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