quarta-feira, outubro 24, 2007
Chico espertice
Entre pessoas livres, racionais e com idêntico acesso à informação, a tentativa de enganar os outros (naturalmente, em proveito próprio...) é um jogo de resultado negativo, colectivamente e individualmente. Cada pessoa tomará as devidas precauções para evitar a fraude, estando, porém, disposta a perpetrá-la contra os outros, se tiver oportunidade para isso e se considerar que a expectativa de ganho líquido para si próprio é elevada. O que acontece é que todos consumirão uma energia incrível para evitar serem tramados uns pelos outros. No fim, ninguém trama ninguém e o resultado final é pior do que o que seria obtido se toda a gente agisse de modo transparente e leal. É pior porque, se mais não for, há os custos de tentar tramar e de evitar ser tramado. Anda demasiada gente a desperdiçar recursos na tentativa de ficar por cima ou de armar em chico esperto.
Nesta proposição há, porém, uma particularidade que faz com que a realidade quotidiana seja diferente da conclusão do modelo teórico. De resto, acontece assim muito frequentemente com os modelos mais sedutores e elegantes. Os modelos só funcionam no âmbito de hipóteses que são mais ou menos heróicas. As hipóteses de base encontram-se na primeira frase do parágrafo anterior: liberdade, racionalidade e idêntico acesso à informação. Quero acreditar que as pessoas sejam razoavelemente racionais (sem querer entrar no debate acerca da mistura da razão e da emoção que comanda os comportamentos humanos). Já no que se refere à liberdade e ao acesso à informação, tenho fundadas razões para pensar que, infelizmente, não se encontram facilmente na realidade. O que há mais são pessoas dependentes (nomeademente, do ponto de vista material) e ignorantes (porque não querem saber ou porque a informação é restrita ou obscura - neste último caso estamos no próprio domínio da vontade de tramar o parceiro...).
Pois bem. Como as hipóteses são irrealistas, a conclusão não é pertinente e, portanto, a boa conclusão (mutatis mutandis) é a de que, efectivamente, vale a pena tentar tramar os outros e armar-se em chico esperto. Helas.
Mais uma vez, nada de novo... Que falta de originalidade a minha !
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