As estatísticas mostram que existe um aumento da natalidade nos últimos anos na Europa Ocidental. Esta inversão de tendência é bem-vinda e, na minha opinião, tem um significado profundo e interessante. A minha tese é a de que ter filhos é uma forma de votar... sociologicamente falando, é uma reacção a determinadas condições sociais. Bem sei que se trata também de uma decisão eminentemente individual e familiar que se situa na intersecção de múltiplas motivações (afectivas, económicas, religiosas, etc.).
O que acontece é que a sociedade tem vindo a privilegiar valores como o materialismo, o individualismo, o sucesso, a competição, o hedonismo, a beleza, a juventude, etc. As pessoas, em geral, aderem e conduzem as suas vidas em consonância com o bombardeamento desses valores feito pela política, pela cultura e por várias formas de publicidade, explícita ou oculta. O problema é que também não escapam aos malefícios desses "sofismas": o stress, a angústia, a depressão, a agressividade, o egoísmo, a perda de sentido, o primado do racional sobre o afectivo.
Pois bem. Uma das respostas a essas ameaças consiste em revalorizar a família. Os jovens, sobretudo, querem casar-se e ter filhos e ter um núcleo de afectos e de conforto, uma espécie de reduto contra a hostilidade ambiente, em que também participam, mas com uma rectaguarda mais ou menos protegida, onde os filhos desempenham um papel central, uma alternativa ao desencanto das ambições venais, uma prova de que a inocência não morreu. Naturalmente, também sabem que se podem divorciar e que a probabilidade de que tal aconteça é mesmo elevada. [A alta natalidade e a alta mortalidade dos casamentos andam actualmente a par...] Mas, as pessoas arriscam da mesma maneira, e o divórcio é uma manifestação eloquente da ambivalência dos tempos modernos: quer-se família e vínculos e segurança, mas também se quer liberdade e autonomia e prazer, tudo ao mesmo tempo e em doses "industriais". Está-se cada vez menos disposto a renunciar e a fazer sacríficios e a ceder. Este não é um tempo de escolhas; é um tempo de bulímica acumulação de "prioridades", de exageradas expectativas cuja não realização provoca, com demasiada frequência, desistência e grande frustração.
As pessoas querem um refúgio contra as adversidades do hiper-modernismo, mas não escapam, mesmo no seio das famílias que criam, aos pecados e às armadilhas individualistas desse hiper-modernismo. Querer ter filhos nos tempos que correm é dizer (principalmente, as mulheres) que se está farto da agressão e do cinismo dos valores dominantes. É dizer que se crê ainda no futuro e que as pessoas não são apenas máquinas de eficiência. É arriscar. E vida sem risco não existe.
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