segunda-feira, maio 14, 2007

À procura da "market failure" perdida

Ando à procura da "market failure". Alguém a viu por aí ? "Market failure" quer dizer coisas úteis que a economia de mercado não fornece. Portanto, coisas que o Estado deve fornecer. "Market failure" é uma justificação para as excepções ao mercado numa economia de mercado.

Há os chamados "bens ou serviços públicos" (aos quais não se aplicam os princípios da exclusão / rivalidade), mas também há outros bens e serviços que não serão fornecidos nas condições colectivamente mais desejáveis, caso sejam deixados apenas ao critério da iniciativa privada. Isto é: o interesse de todos supera a adição dos interesses privados. É para não deixar cair no vazio estas situações que servem os serviços públicos.

Principalmente nas economias mais desenvolvidas, cada vez mais inspiradas pela tecnocracia e pelo neo-liberalismo, o território tradicional dos serviços públicos tem sido ocupado pelos operadores privados. Sectores como a energia, as telecomunicações, os transportes, o ambiente, a saúde, a educação, a justiça têm sido total ou parcialmente privatizados. Diz-se que, assim, se aumenta a eficiência e se aligeira o peso do Estado e, portanto, dos impostos. Para disciplinar minimamente sectores estratégicos e para acautelar os interesses dos consumidores, o Estado cria então entidades de regulação e de defesa da concorrência. As lógicas do mercado e da livre iniciativa parece terem lógica... O Estado passa a ser apenas mais um agente do mercado, a que se rende, como os consumidores ou os produtores. Naturalmente que, para além do lado da produção de bens e da prestação de serviços, também há o lado da distribuição do rendimento.

É provável que os "antigos" bens ou serviços públicos passem a ser mais caros se fornecidos por empresas privadas. Talvez a eficiência da produção e a sua qualidade aumentem, mas o preço também passa a incorporar uma taxa de lucro que não seria requerida pelo Estado. Tornam-se, portanto, acessíveis nas quantidades necessárias apenas a alguns, aos menos desfavorecidos na partilha do bolo social. A universalidade e a igualdade no acesso a bens e serviços como a educação e a saúde são quebradas. Na melhor das hipóteses, desenvolver-se-à um mercado dual: de um lado, os serviços prestados pelo Estado para os pobres, do outro, os serviços prestados pelo sector privado, possivelmente em maiores quantidade e qualidade, para os ricos. Naturalmente simplifico… O Estado, com ligeiros problemas de consciência, para não deixar completamente cair os mais pobres e para defender a paz social, recorrerá, a contra-gosto, aos impostos para assegurar um mínimo de serviços sociais. Mas, o princípio fundamental é o de defender a eficiência e a racionalidade privada numa sociedade dominada pelo indíviduo, pela livre iniciativa, em que a solidariedade é considerada mais um custo do que um valor em si mesmo. A sociedade e a vida transformam-se num imenso mercado, governado pelos interesses individuais, de que resultará, por uma passe de magia, o interesse colectivo. Enfim, a famosa Mão Invisível do incontornável Adam Smith com todas as suas variantes e sofisticações mais ou menos econométricas...

A desigualdade seria fisiológica ao funcionamento do sistema e a procura da igualdade teria custos excessivos e levaria a uma afectação não óptima dos recursos.

Na prática, para além da verborreia teórica, os fracos são tolerados, os fortes são compensados e o chamado mérito é a ideologia suprema, atropelada vezes sem conta por nepotismos e clientelismos de que se alimentam certas élites.

Programa político? Só há um: melhorar as condições de vida através da promoção do esforço individual, tratando a sociedade como uma soma de indivíduos e como um espaço de maximização da eficiência. As soluções são essencialmente técnicas e consensuais. A principal diferença entre a direita e a esquerda (ambas do centro) é o grau de ajuda aos que jogam menos bem a partida da performance.

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