segunda-feira, abril 24, 2006


Há 32 anos, a esta hora, estava-se na véspera de uma mudança inevitável.

A Revolução foi o resultado de uma vontade colectiva, mais ou menos assumida, mais ou menos militante, encabeçada por militares fartos.

Aconteceu em 25 de Abril de 1974, mas olhando hoje para trás, teria de acontecer qualquer coisa de semelhante, por volta dessa data, que desencalhasse a sociedade portuguesa. É inconcebível que Portugal pudesse percorrer o resto dos anos 70 ou os anos 80 na mesma cepa torta, contra todos os ventos e marés da História. Hoje, a esta distância, parece tautológico. Não se pode imaginar que a PIDE, a censura, a guerra colonial, o subdesenvolvimento, a proibição de partidos políticos democráticos pudessem manter-se durante muito mais tempo. Portugal estava exausto da pobreza e da marginalidade.

No entanto, não basta que os factos históricos sejam inevitáveis. Normalmente, o poder repressivo não cai de podre. É preciso que esses factos aconteçam e que existam pessoas concretas que os façam acontecer, tomando riscos, desafiando privilégios e comodidades. Foi isso que aconteceu ao longo de muitos anos de uma luta que culminou em 25 de Abril de 1974. Houve pessoas que deixaram de se resignar, que protagonizaram uma revolta partilhada pela maioria da população, muitas vezes em silêncio. Pessoas que sairam da penumbra e que quiseram participar na aceleração do ritmo da História, no sentido do progresso e da liberdade.

O 25 de Abril foi uma ruptura que introduziu uma dinâmica de estabilidade, após os sobressaltos iniciais de 1974-1976. O "problema" é que essa estabilidade democrática, geradora de alguma modernidade e de algum bem-estar material, gera também o conformismo, a acomodação, o adormecimento das consciências, o primado do "razoavelzinho" ou a absolutização dos sucessos individuais ou sectoriais. E as mudanças sociais passam a ser imperceptíveis, enquadradas, previstas e reguladas pelo novo "establishment" eleito, ou seja, "não mudanças".

Quer dizer: o 25 de Abril, fonte de libertação e de criatividade, paradoxalmente, criou a impossibilidade de mais 25 de Abris, de mais sonhos sem limites, de mudanças radicais das condições em que vivem e trabalham as pessoas.

A chamada democracia madura é o império da sensatez contra as mudanças visionárias. Estas últimas precisam de ditaduras... A democracia madura é coisa de gente crescida, não de crianças enraivecidas com a realidade nua e crua.

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