sábado, novembro 03, 2012

O novo salazarismo

Disse-me que estamos de novo em salazarismo. Salazarismo psicológico, mais do que económico. Esta sensação de vazio, de cansaço, este negrume que se ergue à nossa volta antes de entrar em cada dia, como num longo túnel de mágoas. Durante o salazarismo (de quando havia Salazar), esse vazio era mitigado por uma luta com sentido: pela liberdade, contra a guerra colonial, pela democracia, pelo desenvolvimento. Hoje temos a liberdade de empobrecer, a guerra fria da angústia, uma democracia autista, a asfixia da dívida. Hoje predomina o desânimo, a desistência, a falta de esperança, a expectativa de que as coisas só possam piorar por tempo indeterminado. Este salazarismo é talvez pior porque anula a energia, esmaga a vontade, não deixa espaço a projectos alternativos, apresenta-se como uma fatalidade. Na melhor das hipóteses, gera protestos ecléticos de gente desorganizada que apenas exprime uma revolta impotente. Como se todas as pessoas que se queixam à hora do café se juntassem na praça para dizer aquilo em uníssono. Ou então provoca protestos caceteiros de rabo ao léu e fogueira espúria em frente ao Parlamento. Este salazarismo é hiper-depressivo, no sentido existencial da expressão. Pior do que um povo pobre, é um povo rendido.

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