segunda-feira, janeiro 16, 2012

O downgrading de Portugal pela S&P

Extratos do relatório da Standard & Poor's que baixou o rating de Portugal a BB (11 níveis abaixo do máximo e 10 níveis acima de "default"):

“The downgrade reflects our opinion of the impact of deepening political, financial, and monetary problems within the eurozone, with which Portugal is closely integrated.”

Parece-me pacífico; portanto, a solução tem de vir também da zona euro, noutros termos, de decisões judiciosas ao nível da UE.

“(…) the political agreement [EU summit on Dec. 9, 2011] does not supply sufficient additional resources or operational flexibility to bolster European rescue operations, or extend enough support for those eurozone sovereigns subjected to heightened market pressures.”

Também me parece claro e pertinente. Não vai haver dinheiro que chegue para ajudar todos os que dela precisarem (a começar pela Itália).

“(…) the financial problems facing the eurozone are (...) a consequence of rising external imbalances and divergences in competitiveness between the eurozone's core and the so-called "periphery". As such, we believe that a reform process based on a pillar of fiscal austerity alone risks becoming self-defeating (…)”

Não podia estar mais de acordo. O euro nasceu na base de premissas erradas e continuar apenas a cortar não leva a grande coisa salvo a acentuar as putativas razões pelas quais se deveria continuar a cortar.

“(…) continued fiscal austerity without improving growth prospects could result in widespread unemployment, which could negatively affect social cohesion and political support for the EU/IMF program.”

Penso que neste ponto até a CGTP estará de acordo.

5 comentários:

Teresa disse...

"(...) these modern gods didn’t see the 1997 crisis coming. They understood nothing of the subprime catastrophe. Four days before it went bankrupt, in 2001, they continued to give the energy broker Enron good marks. Up to the very last moment, they supported a Lehman Brothers that was circling the drain of bankruptcy. During the current euro-zone crisis, not content to have failed to see it coming, they aggravated the situation by keeping Greek securities in the basket of first class world bonds and, in so doing, contributed to the laxness of a government that preferred to sink deeper in debt rather than to review its accounts, clean up its public finances, and reform. In short, these agencies whose task it is to foresee have committed blunder after blunder. These agencies of credit have behaved like agencies of discredit."

"They are (...) the twin brothers of the fabulous traders who led Wall Street to the abyss."

"No information regarding the formulas upon which the future of men and, today, that of Europe depend. And this opacity makes the head spin."

Tirado daqui: http://www.thedailybeast.com/articles/2011/12/14/bernard-henri-l-vy-downgrade-moody-s.html

Miguel disse...

The 3 larger rating agencies have been accepted by most players on credit markets (including corporates, banks, sovereigns, funds) as almost unique providers of tangible, simple and standard indicators of risk, based on consistent (albeit variable) methodologies. They took advantage of that acceptance to consolidate an oligopoly and increase global market power. Ratings have been included in a myriad of financial agreements as measures of acceptance or refusal of counterparts and triggers of specific credit actions (replacement of guarantees, provision of collateral, prepayment). Many lenders simply outsourced credit assessment skills to rating agencies giving up of own judgment and of implementation of strong and reliable credit management systems. Credit risk departments were reduced to the role of followers of external ratings and initiators of remedies implemented by themselves or by other dedicated departments. When the credit environment is benign, ratings stand at relatively high levels and remain substantially stable and consensual amongst different agencies, players seem comfortable with the system and contractual commitments are entered into related to rating levels. On the other hand, when credit deteriorates and uncertainty and volatility rise, especially for systemic, macro-economic reasons, the ratings system becomes much less reliable, questionable and prone to generate self-fulfilling effects. Furthermore divergence amongst agencies becomes the rule rather than the exception. Borrowers become vulnerable to factors totally outside of their control and incapable of changing the trend of ratings, whatever measures they might implement.
In a context of recurrent and generalized downgradings, the strict and swift exercise of contractual rights may safeguard immediately the interests of relevant lenders but may also aggravate the overall condition of counterparts particularly if similar actions are taken by all lenders at the same time. Hence, ultimately, lenders’ own interests may be jeopardized. The trend of ratings in recent weeks and months demonstrates that (a) comparative ratings are more important than absolute levels (until recently a negative outlook or downgrading of AAA individual issuers was viewed as dramatic, which is clearly no longer the case); (b) agencies differ increasingly amongst themselves (the recent case of France appears as paradigmatic).

Teresa disse...

Miguel - os meus estudos universitarios de economia limitam-se a 3 cadeiras: Macro, Micro e Economics for Bankers. Mas isto ja foi ha muito tempo, quando o mundo era muito diferente, os problemas e desafios outros. Portanto nao acho que os principios que entao aprendi se aplicam aos dias que correm e por isso te peco desde ja desculpas pela minha ignorancia. Se quiseres, ignora estas perguntas chatas que eu nao levo a mal:

1 – Ja sabia que as 3 agencias eram consideradas “the standard indicators” de risco, mas porque e’ que acrescentas “simple?”

2 – “(…) based on consistent (albeit variable) methodologies.” Podes explicar como e’ que essas metodologias sao, simultaneamente, consistentes e variaveis?

3 – Porque carga de agua e’ que a responsabilidade de cr risk assessment foi “delegada” (outsourced/terceirizada/ incumbida) as agencias de rating? Foi pelas razoes do costume, e.g., lower cost/increase productivity, ou houve alguma razao mais obscura? Essa decisao faz-te sentido?

4 – Se, em tempos de incerteza e volatilidade “(…) the ratings system becomes (…) less reliable, questionable and prone to (…) self-fulfilling effects”, why in God’s name do these cr agencies exert so much clout? Nao concordam umas com as outras, nao sao consistentes e parece que ninguem conhece as formulas que elas usam; porem, tem o futuro de milhoes de pessoas na palma da mao. Quem ganha com isto tudo, sabes?

A razao porque tudo isto me faz muita confusao e' porque, quando eu trabalhei tanto em Commercial Lending (huge real estate loans) como em Consumer Credit (dividas muito menores) uma das minhas responsabilidades era to determine each borrower’s creditworthiness, by verifying things like the Five Cs of Credit e passar, a pente fino, credit reports e/ou financial statements (tanto de individuos como de empresas). O objectivo era minimizar o risco a que o banco se exponha quando emprestava dinheiro. Para isso, tinhamos de seguir determinados rigores, formulas e atribuir a cada devedor um cr score. O Int. Rate (APR e Yield) dependia, entao, desse numero – mesmo principio que as agencias de rating. A ultima coisa que o banco queria eram non-performing assets/collateral on the balance sheet. E’ por isso que nao compreendo esse “fenomeno” do credito facil e subsequente ilusao de bem estar no tempo das vacas gordas. Nem tao pouco entendo a incompetencia destas agencias in the years leading up to the current global financial crisis, e muito menos o peso que ainda exercem. E’ esta falta (a meu ver) de credibilidade que me faz muita confusao.

Entretanto ja’ comecei a ler o tal livro de Krugman. Estou a gostar da informacao e do modo acessivel como ele relata tanto evento historico. ¼ do livro ja esta todo colorido (laranja e amarelo fluorescente) with several annotations and cross-references on the margins. Pode ser que quando o acabe de ler ja esteja mais esclarecida. Ate’ la’, estou como Bernard –Henri Levy: “this opacity makes the head spin.”

Miguel disse...

Trata-se de pretexto para longuíssima conversa... Seja como for, tentarei responder aos teus 4 pontos de forma sintética:

1) simples porque se reduz a seguir uma sequência de letras, como na escola quando te dizem que alguém teve 20 ou menos de 10 (numa escala de 0 a 20); assim se pretende reduzir a complexidade

2) metodologias consistentes, porque baseadas numa análise sofisticada, num conjunto estruturado de premissas de que resultam conclusões aparentemente inequívocas; metodologias variáveis, porque as agências reservam-se o direito de, a qualquer momento, alterar essas premissas, alegadamente por alteração substancial das circunstâncias, daí podendo resultar alterações de rating completamente fora do controlo das entidades que são notadas; portanto há (mais) um elemento de discricionaridade a que não podem resistir os market players...

3) no tempo das vacas gordas, todos (ou quase todos) os credores se renderam à maravilha dos ratings externos e, portanto, subordinaram as suas decisões a eles, delegando a análise de risco, também por questões de rapidez, custos e comodidade. Numa situação de downgradings generalizados torna-se dificil voltar atrás e fazer análise aprofundada e independente porque o tempo urge, o pânico torna-se self-fulfilling e, de qualquer maneira, para quê gastar tempo e recursos a fazer relatórios intermináveis de crédito para chegar a conclusões não significativamente diferentes daquelas que decorrem dos ratings externos que além disso se encontram plasmados em contratos? Torna-se complicado fazer waiver de cláusulas de rating numa situação de deterioração de risco com base nos resultados de análises internas. Pelo menos gera-se muito conflito entre as áreas de front line e de controlo de risco...

4) para além do que já disse, estamos numa armadilha que é difícil desfazer, pelo menos enquanto o ciclo de crédito não se inverter; quando os ratings melhorarem, creio que haverá um forte incentivo a que os devedores deixem de aceitar a "canga" dos ratings

Também é preciso não entrar na lógica do "kill the messenger" quando as notícias não são boas; para mim, os maiores problemas do triunvirato das agências são o exagerado poder de mercado que têm e o efeito de aceleração de tendências que provocam. Também é verdade que se o mercado das agências de rating fosse mais concorrencial haveria talvez maior disseminação de opiniões sobre a mesma realidade o que talvez tirasse credibilidade ao próprio sistema. Quero com isto dizer que o risco de alinhamento das agências, quer nas notações quer nas tendências, independentemente do número de agências, é grande e portanto pode argumentar-se que um maior número de agências vai dar ao mesmo. Quando há consenso no mercado, não interessa o que dizem as excepções. Por outras palavras, sobretudo em situações de crise ou de tendência marcada num ou noutro sentido, o mercado não é outra coisa senão CARNEIRADA. Daí as bolhas e as espirais...

Volta-se sempre ao mesmo: a discussão do próprio cerne do capitalismo e da existência de alternativas como forma de regulação das economias e das sociedades.

Teresa disse...

Depois de ler o livro de Krugman, a impressao com que fiquei e’ que, embora os pormenores (causas) do que se passou (tanto na America Latina, como em certos paises asiaticos como o que, actualmente, se esta’ a passar na Europa e EUA) sejam diferentes, A MEU VER, no fundo disto tudo temos: greed, speculation, false perceptions, erroneous conclusions, self-validating panic, vicious cycles, virtuos circles and good-old moral hazard (aka “crony capitalism”) all fueled by deregulation; am I too off the mark?

E’ por isso que gostei do teu ultimo paragrafo. So’ que, apesar do mais recente Forum Economico Mundial em Davos, nao acredito que isso venha a acontecer. Too many conflicting interests and too many powerful forces with too much to lose. E e’ precisamente por isso que as licoes do passado passam frequentemente “despercebidas” – para nao falar na memoria curta do publico em geral, que se deixa facilmente levar em cantigas.

Ah, e tambem gostei dessa de “canga dos ratings” e de “carneirada dos mercados”, sobretudo por virem de alguem que admiro muito e que tem muito mais conhecimentos sobre o assunto do que eu. E por ser essa, precisamente, a minha opiniao. When all is said and done ficamos com CANGA e CARNEIRADA - a very succinct characterization of what is currently going on, yes indeed…

Espero, um dia, termos entao essa longuíssima conversa; ate’ la’, obrigada pelos esclarecimentos…and thank you for your patience :-)