As chamadas redes sociais são “óptimas” porque nos dão a ilusão de estar juntos, mantendo-nos higienicamente separados. Até parece que não estamos sózinhos, estando literalmente sózinhos. Sem redes sociais, cairíamos talvez na mais óbvia solidão ou meter-nos-iamos à estrada para encontrar pessoais reais, sem mediação virtual, pessoas com lágrimas ou sorrisos autênticos, com olhos baços ou luminosos. As redes sociais permitem-nos ter relações “à la carte”: amigos, amantes, colegas, conhecidos, clientes, fornecedores (sabe deus de quê...), actuais ou potenciais, tudo metido em gavetinhas bem organizadas que se abrem ou fecham conforme o humor, a conveniência ou a oportunidade. As redes sociais permitem-nos restabelecer comunicação com os mais improváveis e longínquos interlocutores (longínquos no espaço e no tempo). E então podemos redescobrir a infância, a juventude, cultivar memórias, tentar reinventar a roda, refazer a história, contactar as pessoas mais inverosímeis. E quantas vezes nos desiludimos e caímos no ridículo porque o que lá vai lá vai, a vida fluiu e levou cada um de nós por caminhos que deixaram para trás cruzamentos que se fecharam irreversivelmente. Não quer dizer que se deva fazer tábua rasa do passado, com o qual crescemos, na alegria e na tristeza, do qual somos feitos, ou que se deva fechar a porta aos benefícios do desconhecido ou do imprevisto (atentas também as surpresas desagradáveis). É tudo uma questão de expectativas. Normalmente, a resolução dos nossos impasses ou problemas actuais passa pelo futuro, pelo risco de novos encontros e não por qualquer putativa reedição do passado. As redes sociais facilitam seguramente a empatia porque este ecrã cava uma distância que, nalguns casos, se sonha eliminar depois de uma fase de encantamento feito da ambiguidade das palavras escritas. Se se quebrar essa distância, passando ao contacto real, com todas as probabilidades de sucesso ou fracasso, diria que as redes sociais cumpriram um papel meritório: o de instrumento ou promotor de relações sociais “concretas”. De qualquer modo, a vantagem minimalista das redes sociais é que podem realmente ser uma alternativa à solidão… admitindo que, infelizmente, seja essa a única alternativa.
As redes sociais são uma forma de compromisso possível entre relações sociais e individualismo, sendo que as primeiras se têm empobrecido nas últimas décadas e o segundo tem prosperado à sombra da absolutização de valores como a liberdade, a autonomia, a responsabilidade e o livre-arbítrio, em detrimento de outros como a solidariedade, a generosidade e a caridade.
1 comentário:
"As redes sociais permitem-nos restabelecer comunicação com os mais improváveis e longínquos interlocutores (longínquos no espaço e no tempo). E então podemos redescobrir a infância, a juventude, cultivar memórias, tentar reinventar a roda, refazer a história, contactar as pessoas mais inverosímeis. E quantas vezes nos desiludimos e caímos no ridículo porque o que lá vai lá vai, a vida fluiu e levou cada um de nós por caminhos que deixaram para trás cruzamentos que se fecharam irreversivelmente. Não quer dizer que se deva fazer tábua rasa do passado, com o qual crescemos, na alegria e na tristeza, do qual somos feitos, ou que se deva fechar a porta aos benefícios do desconhecido ou do imprevisto (atentas também as surpresas desagradáveis). É tudo uma questão de expectativas."
E aqui reside o unico beneficio que vejo nas redes sociais.
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