quinta-feira, novembro 05, 2009

Normalidade democrática

Poder é poder. Não há só poder político. O poder político estende-se ao poder económico, alimenta-se dele e alimenta-o. Sempre assim foi e sempre assim será. Nada de novo. Trata-se de ingenuidade pensar que o poder eleito pelo povo possa permanecer, casto e beato, imúne aos malandros e gananciosos do poder económico, personagens detestáveis que não olham a meios para atingir os fins. O poder económico serve também de instrumento fundamental do poder político e é isso que dá tanto protagonismo e influência aos detentores do poder económico.

Dito isto, essa fisiológica "promiscuidade" não deve ultrapassar os limites (a) da legalidade e (b) dos interesses colectivos que elegeram o poder político. Se (a) for transgredido, entramos no terreno do crime. E, normalmente, os tribunais punem os infractores. Se (b) for transgredido, entramos no terreno da traição à vontade popular e, pese embora os prejuizos que possam ser provocados no entretanto, essa traição será, normalmente, punida em eleições seguintes. Neste discurso, o diabo está na palavra "normalmente" e é por isso que o nosso país não é normal.

O nosso país está a transformar-se numa anomalia, numa anedota de mau gosto, num quase-México da Europa em que nem a corrupção se manifesta de forma subtil ou profissional como noutros países civilizados. Os corruptos portugueses são mesquinhos e medíocres. Passa pela cabeça de alguém cair na lama por causa de um envelope cheio de notas totalizando a ninharia de 10000 euros? Passa pela cabeça de alguém fazer negócios escuros com um pequeno negociante de sucata cuja facturação (declarada...) não chega aos 50 milhões de euros? Que se façam as coisas em grande, com ambição, na justa proporção entre risco e benefício.

Curiosamente, a crise económica e a necessidade de utilizar o poder económico para a combater vulnerabilizaram o poder político face ao poder económico. É de esperar a multiplicação dos casos perversos de promiscuidade entre ambos, de permissividade dos políticos à insídia dos negociantes para apresentar obra feita, muita e rápida.

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