quinta-feira, novembro 26, 2009
Mr Bean
Estava a sair para ir às compras. Chuva miudinha, chão bêbado mesmo à frente da porta de casa. Um pé em sítio matreiro e lá vou eu por ali fora como se fizesse "slalom gigante" nos alpes suiços. Só alguns arranhões cosméticos, coração aos pulos porque podia ter sido bem pior. Levanto-me orgulhoso da capacidade de recuperação e vou até ao carro, estacionado no sítio do costume, atrás da minha casa. Abro a porta, alço a perna para entrar no carro e (lá vai disto ó evaristo) mais um desequilíbrio, mais uma viagem acrobática, desta vez para trás. Cozo-me com o chão húmido, desamparado e rendido à fraqueza da minha negociação com um dia chuvoso. Levanto-me para confirmar que não tinha sido ainda algo digno de hospital. Senti-me quase um herói... Com as calças e o casaco razoavelmente encharcados, meto-me finalmente no carro. Ao volante, sinto umas ligeiras dores nas costas, mas nada de preocupante. Com sorte, arranjei um lugar muito perto da entrada do supermercado. A correr para escapar à chuva que tinha engrossado, meto-me na porta giratória e, por artes do arco da velha, a coisa bloqueia e fico ali sózinho como um peixe num aquário, em meditação. As pessoas, de um lado e do outro da porta, a olhar para mim, à espera da sua vez de entrar ou sair, como se eu fosse um criminoso, culpado de mais um atraso nas suas vidas impacientes. E os segundos passam como uma eternidade e nada acontece e eu ali exposto ao opróbio. Vem um empregado do supermercado com uma chave para forçar o que deixou de funcionar automaticamente. Respirações suspensas à espera do desfecho e abre-te sésamo a teimosia da coisa desistiu e eu voltei à liberdade da abundância do supermercado. Tinha pouco para comprar, só coisas vitais. No topo de um corredor, uma pilha de embalagens de leite meio-gordo fazia de torre de babel. Não resisti. Lancei a mão a uma das embalagens e foi uma hecatombe: a torre desmoronou-se com grande estrondo. Tive de me afastar para não ficar submerso em embalagens de leite meio-gordo. As pessoas olhavam-me, mais uma vez, como se eu fosse um criminoso, pelo menos, um agitador. Senti-me uma espécie de Mr Bean e disse para mim mesmo que bastava de tanto infortúnio e de tanta azelhice para um só dia. Desisti das compras e, de forma quase furtiva, com o credo na boca, fui-me embora. Meti-me em casa, sentadinho em frente à TV com uma taça de chá e um pratinho de bolachas Maria a ver a telenovela, à espera que chegasse um outro dia menos acidentado.
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1 comentário:
Miguel, um pauzinho de canela no chá adoça e aquece. beijinhos
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