sábado, março 01, 2008

O Texas deste mundo


O filme que mais Óscares ganhou este ano (clicar no título) é mais do que o enésimo filme americano àcerca da violência extrema naquele país. Não é apenas o retrato de um paranóico serial-killer (desempenhado soberbamente por Javier Bardem - actor principal de “Mar Adentro” - tornado quase irreconhecível pela caracterização) que mata sem sentido, compulsivamente, gratuitamente, por acaso. Não é só um filme que descreve a rudeza das condições de vida num deserto do Texas, junto à fronteira com o México. De facto, o enredo, que ocupa o centro do filme, é na minha opinião apenas o suporte do debate existencial de um xerife (desempenhado por Tommy Lee Jones) à beira da reforma que não compreende o cinismo e a violência que o rodeiam. Um homem que se sente estranho na selva em que se tornou aquele país, onde a criminalidade atinge um requinte e uma crueldade inimagináveis, onde as relações entre as pessoas são frias, efémeras, utilitárias. A vida humana vale bem pouco no meio daquilo tudo, verdadeiro Far West. No fundo, os Estados Unidos nunca perderam a crueldade que caracterizou em larga medida a conquista do Oeste...

O filme também é intrigante porque, de facto, os desfechos não são claros. O fim é mais ou menos aberto à imaginação dos espectadores e aparece num momento em que se aguarda a resolução de algumas situações deixadas em suspenso.

Em geral, “No Country for Old Men” insere-se numa tendência geral do cinema que retrata a violência e a desumanidade da sociedade actual (estou a lembrar-me por exemplo de “Into the Wild”). Cinema que reflecte uma crise profunda associada ao hiper-individualismo, ao desmoronamento dos elos sociais e das formas espontâneas de solidariedade. Crise que conduz à subalternização de valores como a confiança, a lealdade, o respeito, a sinceridade, a cooperação e à absolutização do dinheiro, da vitória, da eficácia, do luxo, da beleza.

1 comentário:

Anónimo disse...

"...selva em que se tornou aquele país, onde a criminalidade atinge um requinte e uma crueldade inimagináveis, onde as relações entre as pessoas são frias, efémeras, utilitárias...a violência e a desumanidade da sociedade actual...hiper-individualismo, ao desmoronamento dos elos sociais e das formas espontâneas de solidariedade...subalternização de valores como a confiança, a lealdade, o respeito, a sinceridade, a cooperação e à absolutização do dinheiro, da vitória, da eficácia, do luxo, da beleza."

E esta, essencialmente, a realidade da sociedade americana. Um verdadeiro "salve-se-quem-puder" e que acho estar na base, tambem, no modo como o americano tipico encara o resto do mundo: we're number one, os interesses dos outros que vao as tintas.

Mas tambem teem qualidades que admiro e que, infelizmente, nao vejo no portugues-tipico.

Teresa
[que vive neste pais desde 28/8/1976 mas que ainda nao perdeu a sua costela portuguesa e que nao e nada dada a estes nacionalismos estupidos e arrogancia a transbordar]