Custa a acreditar que pessoas de mais de 40 anos se comportem como autênticas crianças no recreio da escola primária, disputando a bola ou batendo no colega porque tem um par de ténis mais coloridos. Mas, é isso que sucede com demasiada frequência na luta frenética pelo poder. As pessoas infantilizam-se e entram em litígios que as tornam patéticas e deploráveis, por vezes, absurdas. Não conseguem distanciar-se do objecto de desejo que é o protagonismo e a capacidade de decidir sobre os outros. Tantas vezes esse poder é tão irrisório e temporário que leva a questionar o que é que realmente as faz correr, de que se alimenta a adrenalina dessas crianças grandes que nunca deixaram de querer marcar golos nem de invejar o brinquedo do menino do lado. E ficam raivosos e sofrem e cometem as maiores atrocidades se, depois de tanto espernear, não conseguem saciar esse desejo alucinante. E um dia, talvez demasiado tarde, acordam e apercebem-se de que puseram todos os ovos debaixo da galinha errada e vêem com clareza o "non-sense" em que se transformou a sua existência e a pequenez dos objectivos que perseguiram, em detrimento de outras coisas de cujo valor se apercebem muito tarde.
Não quer isto dizer que não se deva querer ou sonhar (apesar de, como dizia Nietzche, a fonte de todo o sofrimento ser precisamente o querer...). Não quer isto dizer que o ideal seja a passividade ou a desistência. Sou a pessoa mais insuspeita para não defender a inanição ou uma chamada atitude Zen que frequentemente significa o "deixa andar". Mas entre uma saudável necessidade de afirmação, uma vontade de progredir e inovar, de, talvez, mudar o mundo e a obsessão por objectivos limitados e puramente materiais ou sociais vai um grande passo: o da maturidade, o da espiritualidade, o do gozo do ócio sem sentimento de culpa.
Não se deixar engolir por uma dinâmica de "fazer" e de "querer", imposta mais pelo ambiente do que pela nossa verdadeira vontade, é uma prova de sabedoria. Não se deve viver a vida dos outros... Criar uma margem de segurança em relação às putativas urgências de um quotidiano que se vai sucedendo sem nexo ou paradigma é um imperativo de sanidade mental. É preciso, de quando em vez, olhar para o modo como a nossa vida se desenrola do lado de fora, como se estivessemos em cima de um monte a observar a batalha que se trava numa planície distante e decidir quem é o verdadeiro vencedor. Talvez seja o que observa...
Com tudo isto estou a falar comigo próprio e a tentar convencer-me de qualquer coisa...
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