domingo, setembro 23, 2007

Regresso de férias

Olhei pela janela e vi o carteiro a meter correspondência na minha caixa de correio. Não me lembro da última vez que vi um carteiro. Não me lembro de receber cartas. Quem me mandaria uma carta ? Ou um postal ? Só talvez as finanças a pedir mais dinheiro, depois de tudo o que lhes paguei nos últimos meses. Ou então a loja onde comprei os sofás no ano passado. Esses tipos pedem-nos o endereço e depois fazem de simpàticos, convidando-nos para "eventos especiais", com champanhe e tudo, e umas gajas delambidas a distribuir sorrisos como se fossem caramelos baratos, para venderem mais sofás ou camas ou cadeiras ou armários ou espelhos ou o raio que os parta.

Champanhe é uma maneira de dizer: é mais um espumantezito, dos da Mealhada, que deixa uma azia do caraças, mas que sabe bem com o leitão.

Chegam ao ponto de nos pedir o dia de aniversário e depois, naquele dia, pontualmente, chegam os votos de um feliz dia de anos, assinado um gajo qualquer, gerente de loja, que nos convida a passar por lá, que tem uma prenda magnífica em forma de desconto na compra de uma qualquer traquitana.

Enchemos a casa dessas coisas "tão bonitas" e depois quase não temos espaço para nos mexermos dentro de casa e ainda menos para nos mexermos na conta bancária ao fim do mês.

Não pode ser o Continente ou a TMN ou esses chatos empedernidos. Porque meti na caixa do correio um auto-colante a dizer "publicidade, não obrigado!". Mas, nunca se sabe. Nestes tempos ninguém respeita a vontade de um pobre consumidor. Andam todos malucos, desesperados para vender o que quer que seja ao mais anónimo cidadão, sem saber se tem guita ou crédito para lhes pagar... O que importa pagar? Os objectivos (e as comissões de que é feito o vencimento ao fim do mês) atingem-se quando se vende, não quando se recebe. Isso é outra coisa que explica a falência de Fulano ou Beltrano. Mas, para isso servem os cobradores de dívidas e os desgraçados dos mangas de alpaca dos tribunais que vivem submersos em romances de vidas mal paradas. Sim, porque não acredito que sejam verdadeiros juizes a decidir os milhares de processos por falta de pagamento do roaming dos almas de deus que andaram a bronzear o cú nas Caraíbas neste Verão. Depois voltam e o bronze desaparece, que é um ar que lhe dá, com as facturas que lhes traz o carteiro e com a lenga-lenga da sogra no primeiro almoço "lá em casa" depois de férias. É insuportável como mete o nariz nas fotografias que tirámos debaixo das palmeiras ou a cavalgar as tartaguras e permite-se mesmo sentenciar "como vocês estavam felizes..." e a saliva a escorrer pela boca abaixo como uma vaca cheia de calor depois de mastigar a erva húmida. Puta que pariu a minha sogra. Mas devo controlar-me porque a minha querida Albertina anda farta dos meus impropérios contra a sua querida mãe. E ainda por cima me diz "não custa nada, é só de vez em quando e os meninos gostam tanto dos avós e do arroz doce que faz a Mámi". Senhor que estais no céu, dái-me coragem e entendimento para não frustrar a minha querida Albertina e os meninos, que lhes quero tanto bem. E depois estranham que um gajo tenha pensamentos pecaminosos com a vizinha da frente. Aquilo é que é uma mulher que deve fazer o que é preciso, como deve ser, na hora certa, e levar um homem ao paraíso sem tretas de avós e de meninos... Senhor que estais no céu, ajudai-me porque me assaltam ideias do demónio e um homem não é de pau e puta que pariu a minha sogra e a TMN e o roaming e o regresso de férias...

Volto ao autocarro de manhã cedo para apanhar o combóio que me leva ao Campo Grande. Todos os dias até às próximas férias. Dali vou um pedacinho a pé até ao escritório onde passo o dia a meter carimbos em papeis rectangulares e a sonhar com as ancas da colega da frente. E dizem que é lésbica. Mal empregada... Eu dizia-lhe o que é um homem ! Valha-me deus. Ai se a Albertina me lesse o pensamento. Prometeu-me uma feijoada de marisco para o jantar. Abençoada seja a minha querida Albertina.

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