Agora somos livres. Temos a responsabilidade de tudo ou quase tudo o que se passa nas nossas vidas. O império do livre-arbítrio, da soberania das escolhas individuais, do culto da diferença.
Antigamente, faziam-se coisas porque sim, ou porque os nossos pais, ou porque os nossos maridos, ou porque o Padre, ou porque não podia ser de outra maneira. Tinhamos o nosso percurso tutelado desde o berço até à cova. A vida era pré-determinada pela moral dominante, pela religião, pela família, pela comunidade. Não se contavam filmes: mostravam-se fotografias que apenas mudavam para mais amarelo com o passar dos anos. Havia poucas dúvidas e essas eram despachadas para os domínios (suspeitos) da arte, da loucura ou da marginalidade.
Agora estamos sós, sem saber muitas vezes o que fazer de tanta liberdade, devendo moldar o destino com as nossas próprias mãos. E o céu é o limite de tantas expectativas que, afinal de contas, nunca chegam a levantar vôo... Não deixamos de ser crianças, espantadas pela ilusão da ausência de punição e de restrições. Mas, elas existem... e como !
Carregamos sózinhos os sucessos e as derrotas que durante muito tempo atribuimos comodamente ao "sistema". A ilusão da liberdade individual fez-nos perder alibis. Ilusão que, apesar de tudo, é cada vez menos ilusão. E isso faz parte do progresso da Humanidade, no sentido da imanência e da libertação em relação ao obscurantismo e à opressão dos mitos. O avanço da liberdade, contudo, tem custos. Talvez os principais sejam a solidão e a quebra dos laços sociais.
O que vem provar, mais uma vez, que a vida é feita de contrastes, do sim e do não, da coexistência do bom e do mau. Que cada avanço comporta algum retrocesso. E que procurar conclusões unilaterais e definitivas é uma ficção. Talvez o único império intemporal e inexpugnável seja o da Razão.
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