Fui ver o vencedor do Óscar 2007 para o melhor filme estrangeiro, "Das Leben der Anderen" ("A Vida dos Outros"). Um excelente filme àcerca da Stasi, polícia política da chamada Républica Democrática Alemã (RDA), que ruiu com o muro de Berlim em 1989. O filme conta as escutas, perseguições, traições, renúncias, os compromissos, as conversões, a violência psicológica e moral sob um Estado totalitário, numa sociedade concentracionária. O non-sense da opressão, especialmente, da cultura... Brilhante a interpretação de Ulrich Mühe (na foto).
Só pensar que estive na RDA (em Berlim e em Rostock) em 1982, mais ou menos na altura em que se desenrola a acção do filme... Mostraram-nos as conquistas do socialismo, as agressões do Ocidente. Mostraram-nos a Porta de Brandenburg, do alto do muro, e os mecanismos incríveis de vigilância de todos os movimentos de pessoas e bens, legais e ilegais... Apesar das aparências, já na altura, se respirava um ambiente de fim de regime. A austeridade e a obsolescência dos meios de transporte, dos edifícios, do comércio eram quase patéticas. Mas, a autenticidade, a ordem e o pleno emprego contavam mais do que o bem-estar material do Ocidente a que, de qualquer forma, os pobres não podiam chegar. E a liberdade que contava nos chamados países de "socialismo real" era a daqueles que continuavam a acreditar num sistema condenado ao fracasso e desligado das realidades. Os outros, que viam a repressão, o anacronismo e os favoritismos do sistema, eram simplesmente "destruídos" ou ostracizados. Para esse trabalho de "limpeza", que se tornou cada vez mais desesperado à medida que as contradições e abusos se avolumavam, servia a famigerada Stasi.
Agora, depois de quase 20 anos da queda do muro e de muitos biliões de Marcos e de Euros gastos na modernização da Alemanha de Leste, o desemprego é muito superior à média nacional, o saudosismo floresce, os movimentos mais radicais de direita têm um terreno fértil, a delinquência cresce, as situações de dependência crónica da segurança social multiplicam-se. É certo que uma sociedade anestesiada e traumatizada durante mais de 40 anos não se integra facilmente numa lógica de mercado, mesmo ao fim de 20 anos e de muita generosidade dos "irmãos" da Alemanha ocidental.
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