O ambiente é uma daquelas micro-causas muito na berra nos tempos que correm. À falta de grandes ideologias, as pessoas agora exercem a cidadania e tranquilizam a consciência, aderindo emotivamente a micro-causas, como o ambiente, a igualdade entre homens e mulheres, os direitos dos homosexuais, a filantropia a favor do Terceiro Mundo, o voluntariado nos hospitais e na rua para ajudar os sem-abrigo, etc. E muito bem. Contra isso, nada! Digamos que se passou de um individualismo egoísta moderno a um individualismo pós-moderno cheio de boas intenções, em que o hedonismo se mistura com uma solidariedade "soft", isto é, pouco consumidora de empenho pessoal e pouco arriscada, porque não colide com outras prioridades como a carreira profissional, o sucesso material e a competição.
O ambiente passou a ser "mainstream". Ex-presidentes, vice-presidentes e ex-candidatos a presidentes pugnam pela defesa do planeta, os directores de grupos económicos e financeiros juram respeitar o ambiente. O ambiente é parte integrante da chamada "corporate social responsibility". Forma-se uma estranha aliança (ambiental) entre "green peace", "no global" e sacerdotes do capitalismo. E quando se trata de escolher entre criação de postos de trabalho e desenvolvimento económico, por um lado, e protecção do ambiente, por outro, defende-se, muitas vezes, acaloradamente, a segunda contra os primeiros. Esquecendo que a pior das poluições é a pobreza. Como dizia um poeta do Terceiro Mundo, "quem me dera o fumo de uma fábrica para combater o mal da minha alma e da minha fome".
A hipocrisia raia o absurdo quando os maiores poluidores fazem propaganda da defesa do ambiente na terra dos outros, sem mexer uma palha para cortar a poluição nos seus próprios países. Porque não querem prejudicar os interesses económicos que produzem poluição. Basta pensar nos Estados Unidos e na Austrália que recusaram subscrever o Protocolo de Kyoto. Chega-se ao ponto de utilizar os standards ambientais como argumento de "fair competition" ou "level playing field". Isto é, quem tem menos custos de protecção ambiental consegue produzir a custo mais baixo e, portanto, ser mais competitivo no mercado mundial. Claramente, o futuro do ambiente e o desenvolvimento sustentável (que bonita expressão!) dependem da conciliação do ambiente com o lucro e com a lógica de mercado. Como tantas outras coisas neste mundo de "livre iniciativa".
Um dos passos mais concretos nesse sentido foi a criação na Europa do chamado mercado dos "carbon rights", ou seja, direitos a produzir CO2. Quem polui mais do que uma certa norma pré-definida deve comprar o direito de poluir a quem polui menos do que essa mesma norma. O pressuposto é que a norma implica uma redução global e tendencial das emissões de CO2. As empresas de sectores menos poluentes e/ou que investem na protecção do ambiente podem portanto cobrir esses custos de investimento e gerar receitas adicionais, vendendo direitos de produção de CO2 às empresas mais poluentes. Trata-se, portanto, de uma bolsa da poluição supervisionada pela União Europeia. O início desse mercado foi atribulado pela simples razão de que se emitiram demasiados títulos de poluição, quer dizer, as autoridades sobrestimaram as necessidades de poluição dos agentes económicos, provocando uma oferta de direitos a poluir superior à procura. O que aconteceu foi, naturalmente, uma quebra acentuada das cotações e uma perda de credibilidade do mercado e das metas de redução das emissões de CO2.
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