Todos temos, pelo menos, uma pequenina fantasia, um pequeno sonho que acreditamos ser absolutamente concretizável.
Em crianças, todo o nosso mundo era um grande quadro, pintado por nós, com as cores e as formas que achávamos serem reais. Toda a nossa realidade era um desenho animado da nossa autoria. Mais tarde, começa aquela fase em que esse mundo se começa a dissipar, em que começamos a ver à nossa volta sem o filtro cor-de-rosa que vem de série com todos os seres humanos recém-nascidos. O filtro passa a ter uma cor mais neutra e, por vezes chega a tornar-se cinzento. É duro quando deixamos a infância e nos percebemos que o mundo não depende só dos nossos olhinhos pestanejudos e da vozinha melosa com que conviencíamos os papás a levar-nos ao parque infantil. Quando passamos de crianças para adultos as fantasias vão embora.
Mas nem todas.
Em adultos criamos novas fantasias (não necessariamente mais realistas) em que acreditamos piamente, pois, como já somos gente "madura", achamos que todas as projecções para o futuro são ponderadas, racionais e realistas... Estamos tão enganados...! Esses sonhos ainda são mais duros de perder, porque, na nossa consciência de pessoas adultas achamo-los reais.
Somos tão parvinhos ao achar que podemos controlar o futuro, e somos tão ingénuos por acreditar que as circunstâncias da vida e as pessoas à nossa volta são inimutáveis... As situações alteram-se e as pessoas (incluindo nós próprios) evoluem e isso implica mudança.
E o que fazer quando perdemos uma fantasia? Como reagir à inevitabilidade da imprevisibilidade? Como encarar estas agressões à nossa mania de planear e organizar o que não é programável?
Não há soluções milagrosas, até porque não há iguais maneiras de ultrapassar estas desilusões que nós próprios nos proporcionamos. Contudo, um cúmplice mas melancólico "adeus" é capaz de ser uma boa ideia.
2 comentários:
Caríssima: a vida não é uma ciência, mas sim uma arte, uma espécie de alquimia. Desculpa a banalidade. Há verdades que, por serem banais, não deixam de ser menos verdade. Quando achamos que conseguimos a estabilidade, que quase tudo parece claro e previsivel, eis que começam as "partidas" às quais nos temos de adaptar. O critério essencial deve ser o de manter serenidade, equilibrio e honestidade com nós mesmos, o que também supõe auto-estima. A regra mínima obviamente é a da sobrevivência, mas essa sabe a pouco de mais. Uma das coisas mais duras é a gestão das separações: da infância, dos amigos de outros tempos, dos pais, dos amantes, dos lugares... É preciso força e, sobretudo, encontrar boas alternativas para continuar a viver bem, apesar das sucessivas rupturas que atravessam a vida de todos nós. O ideal seria colocar essas separações numa espécie de tesouro de memórias que nos reforça a maturidade, sem amarguras, nem ressentimentos, nem nostalgias doentias. Olhar para trás com um sorriso de quem soube andar em frente, sempre mais sábio e forte: isso seria o ideal.
Termino só com uma tautologia que ouvi de um grande amigo: o que se passa connosco depende de 3 factores: de nós próprios, dos outros (da nossa relação com eles) e do acaso.
Quando estava a escrever o texto lembrei-me dessa tautologia;)
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