Anda por aí uma certa mania da originalidade. Se os posts nos blogs não são originais, não prestam, é melhor não os escrever. Se numa reunião de trabalho não se têm ideias originais, é melhor estar calado. Se um romance conta apenas mais uma história de amor, não vende. Se se exprime uma opinião que não é original, talvez não valha a pena abrir a boca. Se quem ganha o campeonato são sempre os mesmos, não há tanta excitação. E por aí fora. Antes de mais, é preciso recordar que há verdades que, apesar de não serem originais, continuam a ser verdades. Depois, é preciso saber que a originalidade pode ser inútil e rídicula. A originalidade pode também ser cansativa. Há pessoas que, à força de quererem ser permanentemente originais, fazem pena e tornam-se uma autêntica seca. Há pessoas que se esforçam tanto por serem originais que ficam exaustos e morrem mais cedo, descobrem coisas que são monotonamente diferentes, que acrescentam sempre qualquer coisa de irrelevante, mas acrescentam... lá isso acrescentam...
Que não se entenda que sou um empedernido conservador que odeia as ideias novas e as mudanças. Nada disso. Pugno apenas por uma utilização equilibrada e judiciosa da originalidade para que ela não caia, paradoxalmente, na rotina. Seria uma pena. Quero também defender todos os que têm boas ideias, no lugar e no momento certo, apesar de não serem originais.
E descontraiam-se. Sejam vocês mesmos - mais ou menos originais. Não desesperem se nos últimos instantes, ou dias, ou semanas ou anos, não tiveram uma excelente ideia que fez mudar o mundo e que vos fez parecer mais espertos ou inovadores. Afinal, pertencerão à esmagadora maioria dos seres humanos cuja memória não sobreviveu mais do que 2 gerações à própria morte, que não têm o nome em enciclopédias, no Guinness Book of Records ou... na Blogoesfera dos criativos.
1 comentário:
Ando aqui a divagar por uns textos e deparei-me com um que acho que seria agradável partilhá-lo convosco:
"Se há facto estranho e inexplicável é que uma criatura de inteligência e sensibilidade se mantenha sempre sentado sobre a mesma opinião, sempre coerente consigo próprio. A contínua transformação de tudo dá-se também no nosso corpo, e dá-se no nosso cérebro consquentemente. Como então, senão por doença, cair e reincidir na anormalidade de querer pensar hoje a mesma coisa que se pensou ontem, quando só o cérebro de hoje já não é o de ontem, mas nem sequer o dia de hoje é o de ontem? Ser coerente é uma doença, um atavismo, talvez; (...) A coerência, a convicção, a certeza são, além disso, demonstrações evidentes - quantas vezes escusadas - de falta de educação. É uma falta de cortesia com os outros ser sempre o mesmo à vista deles; é maçá-los, apoquenta-los com a nossa falta de variedade.
Uma criatura de nervos modernos, de inteligência sem cortinas, de sensibilidade acordada, tem a obrigação cerebral de mudar de opinião e de certeza várias vezes no mesmo dia. (...)"
Fernando Pessoa (1987);Sobre Métodos in "Obras Em Prosa, Vol.III", Círculo de Leitores. p.172
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