Há uns meses, um jornal dinamarquês decidiu publicar uns "cartoons" representando Maomé de uma forma alegadamente pouco respeitosa. Num desses desenhos o profeta aparece com uma bomba por baixo de um turbante. Nesta semana, explodiu uma verdadeira crise internacional por causa deste desaforo dos, normalmente timoratos, dinamarqueses: manifestações populares de grande raiva em vários países muçulmanos; boicote aos produtos dinamarqueses nesses países; consultas diplomáticas para exprimir o profundo desagrado dos governos islâmicos; cimeiras entre presidentes desses governos para concertar uma reacção conjunta a mais esta afronta; alargamento dos protestos contra países como a França, onde essas caricaturas também foram publicadas (nomeadamente, pelos jornais France-Soir e Libération); encerramento de representações diplomáticas ocidentais como a da União Europeia em Gaza; tomadas de posição virulentas por parte de várias comunidades muçulmanas em países europeus.
Tudo isto parece patético e, no mínimo, excessivo mas, no fim de contas, prova até que ponto as referências religiosas são importantes no mundo islâmico, até que ponto esse mundo está hiper-sensível a todo o tipo de ataques ou humilhações (aparentes ou reais) do Ocidente. Este episódio mostra igualmente o que significa, em cada um dos contextos, a liberdade de expressão e de divulgação de imagens, mesmo que se trate de representações simbólicas de coisas consideradas sagradas.
As civilizações parecem actualmente placas tectónicas, deslocando-se abruptamente umas contra as outras e libertando muita energia que pode degenerar em terramotos e, a médio/longo parazo, numa reconfiguração dos continentes culturais e religiosos. Também se poderá dizer que o Ocidente está apenas a recolher as tempestades dos ventos que foi semeando.
Interessante este link para aprofundar o tema.
2 comentários:
eu so penso na quantidade de caricaturas que já se fizeram de figuras de outras religiões...
eu penso nas tentativas de ver jesus cristo em fritadeiras, tostas mistas, pedras da calçada... julgo que isto se deve sobretudo a um fundamentalismo por parte de líderes religiosos, fundamentalismo esse que não é exclusivo do Islamismo, simplesmente que a preocupação deriva de sabermos que as sociedades em que eles se regem não se fundam nos mesmos valores que os nossos. Particularmente, no que toca à (não-)laicização do poder político, ou de questões do foro constitucional dessas sociedades. esta diferença de organização social deve tender para a harmonia porém, diferentes modos e filosofias de vida resultam em perspectivas e sensibilidades diferentes para cada questão, tornando o equílíbrio muito mais instável. às vezes, parece ser uma corda bamba. Também não se pode fechar os olhos às questões históricas, em que o Islão se vê constantemente ameaçado com a expansão da globalização (e nalguns casos, o imperialismo de certos poderes), o que promove as acções de crácter mais sentimental, ou irracional, ou mesmo nacional se preferirem (se é que se pode ver o povo mulçumano como uma nação, tenho reservas quanto a isso, não obstante a quantidade de 'gritos de guerra' destinados ao povo mulçumano em geral).
Por outro lado, vemos uma clara tentativa de democratização do Médio Oriente, o berço do Islão. Até agora, a resistência é considerável e o avanço dessa democratização é, e será certamente, lenta e arrasta(rá) consigo inúmeros e variados conflitos. Até que ponto esse avanço será permitido não sabemos. O que se consegue saber, concretamente com este caso da sátira, é o da certeza de que eles não estão para brincadeiras.
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