Morreu ontem nos Estados Unidos, com 84 anos, uma personagem intrigante e misteriosa que teve um papel decisivo na gestão das finanças da Cúria Romana nos anos 70 e 80. Trata-se de Monsenhor Paul Marcinkus, também conhecido como "o banqueiro de Deus", nascido em Chicago, ordenado sacerdote em 1947. Foi chefe do Instituto para as Obras da Religião (IOR) e foi acusado em 1982 de participação activa no escândalo da falência do Banco Ambrosiano, instituição financeira italiana muito próxima do Vaticano. Só não foi preso porque gozava da "imunidade vaticana".
Era um autêntico "Manager" dos investimentos da Santa Sé que incluiam acções cotadas na Bolsa de Wall Street e o financiamento do sindicato polaco "Solidarnosc" de Lech Walesa. Mantinha estreitas relações com figuras de destaque da finança internacional. A partir de certa altura, o banco central de Itália começou a investigar as actividades crescentemente arriscadas do IOR, as quais tinham sido inspiradas por um tal Michele Sindona, radicado em Nova Iorque e membro do círculo mafioso italo-americano. Sindona colocou Marcinkus em contacto com Roberto Calvi, Presidente do Banco Ambrosiano; ambos fundaram em 1971 o Cisalpine Overseas Bank no paraíso fiscal das Bahamas.
O IOR funcionou durante vários anos em perfeita sintonia com as múltiplas operações de Calvi, incluindo o controlo da Rizzoli-Corriere della Sera (para evitar a entrada do Partido Comunista Italiano, em ascenção eleitoral, naquele grupo de media), o financiamento de numerosas associações político-religiosas em todo o mundo e a criação de várias entidades bancárias na América do Sul para impedir o avanço do marxismo naquele continente (segundo as palavras do próprio Calvi).
Calvi e o Banco Ambrosiano situavam-se no cruzamento de obscuras influências católicas e maçónicas. Em 1982, Calvi apareceu morto debaixo de uma ponte em Londres; as circunstâncias da sua morte nunca foram esclarecidas, permanecendo a tese do suicídio por demonstrar. Antes de morrer, desesperado perante o colapso iminente do "seu" Banco Ambrosiano, Calvi escreveu a João Paulo II, denunciando Marcinkus como membro de uma putativa ala massónico-curial e pedindo que fosse a Opus Dei a gerir o Banco, após injecção pelo Vaticano de qualquer coisa como 1200 milhões de dólares.
O Banco Ambrosiano acabou por falir. Com o beneplácito papal, Marcinkus sobreviveu a tudo isso, mantendo-se como chefe do IOR até 1989. Desde então, as finanças do Vaticano mudaram consideravelmente, com a Opus Dei a suplantar a igreja norte-americana na gestão do IOR, o qual permanece uma instituição financeira à parte: o banco da igreja católica, usufruindo de regalias e imunidades "sui generis".
Monsenhor Marcinkus acabou os seus dias numa casa de repouso para idosos no Arizona. Numa das suas raras entrevistas perguntava e respondia, ao mesmo tempo, da seguinte forma: "Pode viver-se neste mundo sem se preocupar com o dinheiro? Não, não se pode dirigir a Igreja com Avé Marias."
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