Antes de mais nada, devo precisar que detesto fazer compras, principalmente, para mim próprio. Acho uma perda de tempo, não tenho pachorra para passar um tempo infinito a fazer escolhas súbtis, entre côres e feitios. Quando verdadeiramente preciso, demoro pouco a decidir-me e um dos critérios da minha satisfação é o tempo que gastei no exercício. O outro, importantíssimo, é o preço. Não me importo que me chamem semítico... porque não é verdade. E já agora, estou-me positivamente nas tintas para as marcas. Conta apenas a relação intrínseca qualidade-preço. Também aprecio o ambiente da loja, o bom gosto da decoração, e a gentileza dos empregados e o facto de não se intrometerem, de não forçarem o que quer que seja. Abomino vendilhões ou vendilhonas que andam à minha volta como abútres e que, ainda por cima, acham que têm graça, que são competentes, muito comerciais e simpáticos. Quero ser livre de olhar e de tocar a mercadoria que me apetece e... basta. Não quero que me digam que isto ou aquilo é muito mau e não se deve comprar, porque, então, não compreendo o que diabo é que aquela coisa está ali a fazer. Também não suporto ignorância primária em relação ao ofício. Com as moças e os moços que se encontram no comércio a título precário, por vezes, só umas semanas ou nem isso, para fazer uns trocos, é frequente receber respostas caricatas às mais triviais questões. Já me aconteceu ter de inserir eu próprio o cartão de crédito na máquina porque a menina não sabia como funcionava...
Tudo isto vem a propósito da experiência traumática que vivi hoje na abertura dos saldos numa cidade próxima do sítio onde vivo. As ruas estavam apinhadas de gente, as lojas a abarrotar. Notava-se um empenhamento militante das pessoas em encontrar a pechincha mais incrível. Digamos, que se respirava um certo stress, como se se tratasse de uma competição aguerrida para chegar ao melhor negócio. Inicialmente, disse a mim mesmo que me estava nas tintas, que não iria entrar naquela vertigem, que seria um simples observador da gula alheia, talvez um presunçoso mirone dos mais básicos instintos dos seres humanos enquanto "consumidores racionais". Porém, ao passar por uma loja de roupa que tem, normalmente, coisas que me agradam, não resisti e entrei. Fui contagiado. Peguei em 2 camisas e dirigi-me à caixa. Estava na fila, olhando em torno, e vi um pullover a alguns metros dali. Saí da fila e fui ver o dito pullover. Apoiei as camisas num pequeno balcão que ali havia e, eis senão quando, um indíviduo com aspecto bronco agarra nas camisas e começa a investigá-las, abrindo-lhes os botões, como se quisesse ir a uma cabina experimentá-las. Eu disse que aquelas camisas eram minhas e apontei-lhe o sítio da loja onde talvez pudesse encontrar outras parecidas. Ele perguntou-me se já as tinha pago. Como não era o caso, não podiam ser minhas. Olhou-me com insolência e desprezo e continuou, imperturbável, a observar as camisas em detalhe. Disse-lhe que ficasse com a merda das camisas e, já agora, que também podia analisar com a mesma minúcia a treta do pullover que me fez desviar a atenção das camisas durante a fracção de segundo que foi suficiente para as perder (porque não estava disposto a armar escândalo numa loja cheia de gente sob o efeito de uma estranha droga, ainda por cima, não estando convicto, desde o princípio, da participação naquela orgia). O tipo agradeceu com a maior naturalidade do mundo, sem sequer desviar os olhos das "minhas" camisas.
E assim se terminou a minha aventura nos saldos. Fiquei furioso durante uns minutos (poucos). Mais comigo próprio do que com o troglodita que me roubou as camisas. Que não eram muito bonitas, mas que eram uma pechincha do caraças. E ando mesmo a precisar de camisas... A seguir, fui a uma loja de discos e comprei (sem ser em saldo) um CD com o Requiem de Mozart, interpretado pela Orquestra Filarmónica de Viena e dirigido pelo maestro Karl Böhm. É o que estou a ouvir agora, enquanto escrevo este insignificante desabafo.
3 comentários:
essa história é o cumulo
uma história nada engraçada insignificante que me irrita imenso, e a alice tb deve irritar eu referir sempre isto:
Após a compra de bilhetes nos cinemas Dolce Vita existe um funcionário cuja função seria, a meu ver, verificar se as pessoas têm bilhete e deixá-las entrar na sala. Até aqui tudo bem. Acontece que estes funcionários foram ensinados ao belo estilo fordiano e a função deles na practica é outra: porque ninguém se dirige a eles sem ser com os bilhetes, 95 % do seu trabalho consiste na leitura do bilhete em questão e posterior indicação ao consumidor. O que eu detesto porque considero desrespeitoso à jnteligência de um indivíduo. Pensarão eles que não sabemos ler? Então porque raio vamos ver um filme, cujas possibilidades de ser estrangeiro legendado em português são bem superiores de um filme portugês/lusófono? Acharão eles que somos estúpidos/burros, que agimos quais ovelhas ou cães amestrados e que não temos o discernimento de ler a porra de um bilhete? Ou apenas é mais uma táctica de adormecer o cérebro ao ponto da dormência até que nos seja incutido tudo o que temos que fazer, agir, pensar. É este um sinal (pequeno, é certo) de caminharmos nesse sentido?
(mais um desabafo. desta vez fica registado)
Alexandre, por favor, cala-te com essa história... Sempre foi assim e eles não vão mudar! Por favor, não voltes a mencionar esse facto (irritante, é certo) da forma irritante e persistente como fazes sempre que vamos ao dolce vita ver um filme!
PS- és um chato;)
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