Problemas orçamentais e a rendição à (axiomática) eficiência da iniciativa privada e ao chamado "government failure", colocaram na moda as chamadas parcerias público-privado (PPP) como mecanismo para realizar, financiar e gerir projectos que, tradicionalmente, eram executados pelo sector público. A moda não é só portuguesa: espalhou-se por todo o mundo, com maior ou menor contágio, para gáudio de consultores de todo o tipo. A lógica consiste em transferir para o "privado" certos riscos (e benefícios) para obter uma infraestrutura e um serviço de superior qualidade. Estamos a falar de estradas, hospitais, escolas, prisões, abastecimento de àgua ou de energia, etc. O objectivo (mágico) consistiria em compatibilizar o interesse público com o lucro privado. Não se pode acusar o parceiro privado de pretender lucros da participação nesses projectos, porque essa é a sua "razão de ser", a sua motivação. Mas, o lucro deve ser a contrapartida de uma tomada de riscos proporcional. Maiores riscos deverão traduzir-se numa expectativa de taxa de lucro mais elevada. Ora, aqui é que está o "busílis", porque, nas negociações com o parceiro público, o parceiro privado consegue, frequentemente, uma tal protecção contra os riscos que a taxa de lucro se torna quase garantida. Isto é: o lucro descaracteriza-se em renda (para não lhe chamar simplesmente subsídio).
A chave da pertinência e do sucesso das PPP é a afectação e gestão dos riscos entre os parceiros. Estou a falar de riscos típicos de projecto, como por exemplo, os riscos de concepção, de construção, de tráfego ou de mercado, de performance do operador, de variação de preços, de "force majeure", etc. O sector público deve ter capacidade negocial para obter um binómio equilibrado "riscos-benefícios" e para evitar a concessão ao sector privado de privilégios indevidos. A regra clássica, de natureza geral, que se encontra em todos os compêndios sobre a matéria é a seguinte: um determinado risco deve ser tomado pela parte que se encontra melhor colocada para gerir e mitigar esse mesmo risco. É óbvio que a aplicação concreta dessa regra é tudo menos fácil, dada a complexidade e aleatoriedade dos riscos, bem como a natural resistência das partes a correr riscos... a não ser que obtenham compensações generosas. Por exemplo: o construtor de uma auto-estrada tentará encontrar todos os alibis, no seio dos contratos de construção e de concessão, para fazer o Estado pagar a derrapagem dos custos ou o atraso na conclusão da obra; o operador, suposto tomar um risco de mercado significativo, tentará obter do Estado o compromisso de pagar compensações caso o tráfego seja inferior às previsões de uma pequena %.
Uma questão a montante é a de determinar o porquê do recurso a uma PPP, em vez de executar o projecto segundo o mecanismo tradicional de empreitada exclusivamente pública. Alguns países, como o Reino Unido e a Holanda, desenvolveram metodologias sofisticadas para, caso a caso, avaliar as vantagens e desvantagens de cada uma das fórmulas. Trata-se do chamado "Public Sector Comparator", quer dizer, a PPP é comparada à alternativa "pública", designadamente, em termos económicos e financeiros. Uma decisão é tomada à luz dos resultados desse exercício de avaliação e não de acordo com modas ou com dogmas.
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